(#36) Torre, mancha, carro
Isto é ridículo, disse, no momento em que tomou conta do lugar do condutor. Isto não faz sentido nenhum, que disparate.
Olha, não queres vir, não venhas. Eu disse que podias não vir.
E depois tu ias ficar chateada.
Pois ia.
Vês? Então eu tinha de vir.
Nunca estás com os meus amigos…
E tinha que ser logo hoje? Tinha que ser assim? Tantos dias no ano…
Oh, não sejas assim… estamos tão engraçados!
Engraçados? Esta é máscara mais ridícula de sempre. Mancha de tinta?
Sim, querido. Cada um com a sua cor. A ideia é sermos todos uma palete, já te expliquei.
Pois já e continua a ser ridículo. Mas está bem. Para Torres apanha-se a A8, certo?
Estás a ver esta, esta aqui? Esta é nova! – disse o homem irritado.
Como é que distingue? – perguntou-lhe o jovem.
Porque sou guarda desta torre há 52 anos. Estaciono neste lugar há tempo suficiente para conhecer cada mancha, cada marca e cada risco que ele tem no capot! O velho guarda ficou a regougar enquanto o jovem se afastou dali. Estava farto de ter o carro todo estragado, sabia-se lá porquê.
Esperou pelo final do seu turno para fechar a torre mas naquele dia não se foi logo embora. Resolveu subir ao cimo da torre que todos os dias guardava. Observou a cidade toda lá de cima quando tirou uma moeda do bolso. Iria fazer como os casais apaixonados que ali subiam e pedir um desejo. Foi quando atirou a moeda da torre e desejou que lhe deixassem o carro em paz que percebeu que a próxima marca seria culpa sua.